A briga seria histórica, mas tudo terminou na santa paz

Um terrível encontro, possivelmente com saldo dos mais desagradáveis para a comunidade, que vivia em completa harmonia. Seria a grande contenda de todos os tempos, podendo resultar em danos para os dois “gladiadores” e tomando-se então marco na história dos grandes fatos já ocorridos no século 20, em Itapetininga.
Naqueles anos, finais de 1930 e 1940, grande parte da população se sobressaltou com o incêndio desproporcional verificado nos depósitos de algodão da Cia. Soares Hungria, na Avenida Peixoto Gomide; surpreendeu-se com o crime ocorrido na mesma avenida, quando um estudante abateu a tiros de revólver um importuno que desrespeitou sua namorada; penalizou-se com outro incêndio que atingiu a residência do popular e estimado médico Dr. Paulo Braga, na rua Quintino Bocaiúva, atrás da Igreja do Rosário e, entre outros lamentados casos, a descoberta de um jovem – sofrendo de faculdades mentais – que se encontrava em cárcere privado por mais de 12 anos em residência na “Vila do Paquetá”.
Mas, naquela noite, a briga anunciada entre dois adolescentes, ia se tomar memorável “jamais olvidada por nenhum morador da cidade”. As desavenças vinham se registrando amiúde. Por mínimas insignificâncias havia um começo de discussão sempre com a interferência de colegas que evitavam um choque maior. Questões de somenos importância eram razões para que os dois se alfinetassem, provocando acirramento dos ânimos. Casos de família, problemas passionais, económicos e de “status social” eram motivos para acalorados bate-bocas, imediatamente acalmados por presentes, amigos de ambos que não queriam confusão. Essa rixa não se aprofundava em ódios ou espirito vingativo, porquanto as respectivas famílias viviam em festiva harmonia.
O famoso quadrilátero, onde se encontrava a tradicional praça dos Amores – agora descaracterizada – constituía-se a alma de Itapetininga. Bar São Paulo, Casa das Novidades (hoje estacionamento do Bradesco), Bar Primavera, Prefeitura e, já na Júlio Prestes, a refinada Confeitaria pertencente à família Carpinelli, Clube Venâncio Ayres, anexo a uma velha residência com barbearia e uma loja pertencente ao pai do saudoso Karnig Bazarian. Logo na Venâncio a pensão do Sr. Jardim, a Padaria São Francisco e, na mesma direção, a residência do Sr. Francisco Rosa, progenitor de Fernando Rosa. Na esquina da Major Fonseca com a Venâncio o antigo casarão dos Samarco – com a padaria e confeitaria. Também na esquina da Venâncio com a praça dos Amores, o legendário Bar Rodovia, a casa Guidugli, a residência do Sr. Amador de Oliveira, proprietário da extinta fábrica de bebidas Santa Eliza e a Casa Betam. Esse cenário seria o encontro dos dois jovens, quando Alberto e Elias Lerner iam porfiar, por motivo “fútil, inconcebível e até ridículo”. Naquele tempo já se falava implantação do Estado de Israel e eram constantes as lutas entre árabes e judeus, por questões políticas, que estavam abalando o oriente e preocupando todos os países.
Colegas do ginásio. Elias israelita e Alberto árabe, sem nenhuma razão decidiram se enfrentar para decidir qual o mais forte e corajoso, isto perante grande número de amigos e colegas. Ansiosos e aguardando a “batalha” encontravam-se Paulo Mendes, José Carlos de Oliveira (irmão de Carlos José), William e Toninho Yared, Xuca, Areis Moraes, Abílio Abib, Waldir Pacca, Daniel Carneiro, Ari Codorna, Milton e Mopir Válio, Rubens Hungria, ítalo Andrione, Ademar Marinho, Tonico Benedito de Oliveira e outros. Na época haviam os israelitas – os únicos da cidade – Moshe Grajkar, José Lerner, Benjamin Perloff e Marcos Lerner, enquanto que a colônia árabe se compunha de quase uma centena de famílias, mas “jamais tiveram qualquer desavença”.
Após os preparativos iniciais, os assistentes entenderam ser uma grande tolice “lutarem e se machucarem pois todos eram colegas e amigos e os países Israel e Síria iriam logo entrar em fase pacífica. Tanto que em 14 de maio de 1948 foi criado o Estado de Israel. Para coroar a anunciada briga que não houve, personagens do embate e os espectadores em geral foram saborear, com gasosa da fábrica de Eugênio Ventura, os saborosos e inconfundíveis pastéis do legendário Bar São Paulo, então dirigido por Samuel Venturelli.

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