Escrita pela advogada e atriz, Mayara Nanini, a peça “Nhô”, foi lançada e apresentada em algumas escolas do município, no último fim de semana. Contemplada pela Lei Paulo Gustavo, a obra é inspirada na história de Abílio Victor, também conhecido como “Nhô Bentico” e mostra sua determinação para seguir os seus sonhos, vindo de uma humilde criação.
Dirigidos pelo professor de artes, Milton Cardoso, o elenco formado por Felipe Fogaça, Maria Eduarda Souza, Isolete Rosa, Gabriel Lara e Fernando Nascimento, alternavam entre si a interpretação de diversos personagens que faziam parte da trama. Além da troca de personagens e figurinos na coxia, os atores ainda cantavam e tocavam instrumentos durante a apresentação.
Apesar dos erros rotineiros, como o peão da versão criança de Abílio Victor nunca rodar conforme o esperado, a plateia fora surpreendida pela afinação vocal dos atores, que ainda por cima dançaram e auxiliaram o ator Fernando Nascimento a se equilibrar em pernas de pau por um bom tempo.
A primeira exibição da peça aconteceu no dia 22 de setembro, apenas para convidados, e contou com uma roda de conversa para a plateia, que parabenizou o elenco sobre contar a história de um dos maiores comunicadores da cidade e reviver momentos importantes como o primeiro voo de Anésia Pinheiro Machado, e a primeira transmissão de rádio em Itapetininga.
“O ‘Nhô’, na verdade, é uma tentativa de resgatarmos um pouco dessa cultura que está desaparecendo. Quando pensamos em fazer esse projeto, a ideia básica era trazer alguns elementos da nossa cultura, da nossa identidade, para que crianças, jovens pudessem conhecer a história e assim resgatarmos nossa tradição”, diz o diretor Milton Cardoso.
Os ensaios duraram cerca de sete meses e o grupo compartilhou como foi pesquisar além das histórias. “Para o figurino tive que pesquisar muito também, entender como era na época, além de também entrevistar pessoas que realmente vivem do que os meus personagens faziam, como a cigana”, comenta Isolete.
Questionados sobre futuras apresentações, o grupo informou que irão se apresentar apenas em escolas, mas torcem para que a Lei Paulo Gustavo o auxilie com demais apresentações futuras. “Afinal, montamos um cenário exclusivo para isso, pesquisamos figurinos, entrevistamos pessoas…nada mais justo”, diz o ator Gabriel Lara.
A Lei Paulo Gustavo (Lei Complementar nº 195/2022) viabiliza o maior investimento direto no setor cultural da história do Brasil. São R$ 3.862.000.000,00 (três bilhões oitocentos e sessenta e dois milhões de reais) para a execução de ações e projetos em todo o território nacional.
A Lei é, também, um símbolo de resistência da classe artística. Foi aprovada durante a pandemia de Covid-19, que limitou severamente as atividades do setor. É, ainda, uma homenagem a Paulo Gustavo, artista símbolo da categoria, vitimado pela doença.
As condições para a execução da Lei Paulo Gustavo foram criadas por meio do engajamento da sociedade. Em 2022, após a aprovação do Congresso Nacional, o Executivo tentou impedir os repasses por meio do veto integral da Lei e por meio de uma Medida Provisória. Apoiado pelo segmento artístico-cultural e pela sociedade civil, o Supremo Tribunal Federal anulou a Medida Provisória e deu o aval para a execução.
Depoimentos do público
“No último domingo, 22, tive a grata oportunidade de apreciar a ‘Arte’ em sua essência, pessoas que além de seus afazeres diários se debruçam sobre memórias do povo itapetiningano, com objetivos evidentes: viver a arte, resgatar e perpetuar a história (…) É eminente que ações precisam ser realizadas contra o apagamento que vem ocorrendo sobre as memórias de diversos grupos. No decorrer da peça temos referências de nosso dia a dia como o Xé em suas diversas possibilidades e a escola Peixoto Gomide, com as normalistas e sua grandiosidade. ‘Nhô’ chega para nos mostrar efetivamente que somos colecionadores de memórias, através de uma dramaturgia leve, marcante e com atores primorosos” – Adriana Oliveira, professora de Geografia.
“Minha experiência inesquecível com a peça ‘Nhô’. Peça genuinamente a cara da nossa gente, do nosso povo itapetiningano. Me fez rir, me fez sentir saudades do que não vivi, mas muito ouvi falar. As modas, os valores e as dores, que jamais apagaram as alegrias do dia a dia. Chorei e logo esqueci, não pude resistir a esperança que despertou ‘Daquele olhar’. Contar detalhes, não consigo, só sei que Vivi! Essa Arte não pode parar!” – Elideise Aparecida de Campos.
“Domingo fui assistir uma peça no espaço da Igreja São Roque. (…) excelência é o que define esse espetáculo. Excelente desempenho dos atores, do diretor e do texto que com maestria resgata parte de nossa memória caipira, pinçando durante o enredo nossas tradições rurais e urbanas, desde a Festa do Divino ao nosso xéee, do rádio e das superstições, das modas de viola e da catira numa mágica a qual o teatro nos abençoa. Eu que sou caipira raiz, me senti enaltecida e respeitada por essa cultura muitas vezes menosprezada. O projeto prevê a apresentação em alguns espaços escolares, onde a transmissão desse conhecimento deve de fato acontecer, parabéns a todos por nos presentear com essa beleza de trabalho!!!!” – Luciana Regina Matelli (Cirurgiã dentista).
Abílio Victor – O Nhô Bentico
Desde menino demonstrou tendência pela vida artística, representando papéis nos circos, que improvisava com amigos. Aprendeu o ofício de carpinteiro e ficou conhecido como Nhô Victor, procurado por peões os quais aperfeiçoava com maestria, declamando poemas enquanto torneava os peões e realizava o trabalho de rotina. Notabilizou-se como um dos maiores poetas sertanejos em nível regional e nacional. Ao retomar para Itapetininga, trabalhou na Tribuna Popular, O Democrata, O Itapetininga e na Tipografia Artística.
Quando foi instalada a rádio local, a PRD-9 – Rádio Difusora de Itapetiningo, iniciou a carreira, que o consagrou popularmente com o Programa da Saudade. Nele, o artista declamava poemas de sua autoria, posicionando seu linguajar característico. Tempo depois se tomou apresentador do programa Manhas de Minha Terra, o qual ficou no ar durante 10 anos.
Foi compositor de muitos poemas, conhecidos em todo o Brasil e reunidos em dois livros: Folhas de Mato e Favas de Ingá.
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