O Jornal Correio de Itapetininga entrevistou Tiago Rechinelli Viana Vieira de Paula, Advogado e Professor de Direito Penal e Direito Constitucional, pós graduado em Direito Público pelo Damásio e bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Jornal Correio: Por que os crimes de oito de janeiro são julgados pelo STF ?
Dr Tiago Rechinelli: Inicialmente, é essencial sublinhar a competência originária do STF para instaurar inquéritos em casos de infrações penais ocorridas em suas dependências, conforme estipulado pelo Regimento Interno da referida Corte. Esse Regimento concede ao presidente do STF a prerrogativa de iniciar investigações quando a infração envolver autoridade ou pessoa sujeita à sua jurisdição, o que se aplica diretamente aos atos cometidos no STF durante os eventos de 8 de janeiro.
Dentre os investigados, estavam alguns parlamentares, o que naturalmente atraiu a competência do Supremo Tribunal Federal, visto que a Constituição Federal atribui foro por prerrogativa de função, popularmente conhecido como “foro privilegiado”, aos membros do Congresso. Por conta disso, como houve concurso de pessoas envolvendo autoridades com foro privilegiado e réus comuns, aplicaram-se os institutos da conexão e continência, previstos no Código de Processo Penal, visando assegurar um julgamento uno e harmonioso, evitando a separação dos processos.
Jornal Correio : Qual o trâmite de processo originário no STF ?
Dr Tiago Rechinelli: Por não haver órgão julgador acima do STF no Judiciário brasileiro, não há para onde recorrer a não ser para o próprio STF, o que, naturalmente, diminui a chance de êxito de um recurso, visto que a reanálise será feita pelo próprio órgão que proferiu a primeira decisão. Assim sendo, é possível recorrer de decisão proferida pelo STF, mas serão recursos internos na própria Corte, sendo estes limitados na forma de agravo regimental ou embargos.
Jornal Correio : E as decisões dos processos dos atentados de oito de janeiro ?
Dr Tiago Rechinelli: Segundo informações recentes, o STF já condenou mais de 200 executores dos atos de 8 de janeiro, com penas que variam de 3 a 17 anos de prisão.
Os crimes imputados aos condenados são graves e possuem penas altas. São eles: abolição violenta do Estado Democrático de Direito, dano qualificado, golpe de Estado, deterioração do patrimônio tombado e associação criminosa armada.
Não obstante, também houve absolvições, sendo estas fundamentadas na insuficiência de provas.
Jornal Correio : E sobre o caso do pré-candidato do PL de Itapetininga ?
Dr Tiago Rechinelli: Sobre o processo envolvendo pré-candidato a cargo municipal em Itapetininga, este se encontra público e de livre consulta, o que me possibilitou a análise da denúncia, que compreende a peça elaborada pelo Ministério Público, no caso pelo Procurador-Geral da República, que inicia a ação penal, sendo o momento em que se imputam fatos tidos como criminosos ao réu, buscando sua condenação.
No caso citado, trata-se de uma denúncia sucinta de dezesseis laudas, datada do último dia 4, onde, através de descrições genéricas dos crimes praticados nos atos de 8 de janeiro, sendo eles associação criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado, busca-se a condenação do pré-candidato a prefeito.
Conforme descrito pelo PGR, o pré-candidato teria afirmado publicamente em programa de rádio que financiou pessoas que participaram dos atentados de 8 de janeiro, o que, supostamente, teria configurado sua participação indireta e subjetiva nas ações delitivas praticadas por terceiros.
Com despacho proferido pelo Ministro Alexandre de Moraes, foi aberto prazo para que a Defesa do pré-candidato ofereça defesa prévia.
É certo que o processo em questão acabou de nascer, e que ainda há muito pela frente. Além da defesa prévia, haverá momento para a produção de provas testemunhais, documentais e eventualmente periciais, bem como o réu será interrogado em audiência futura.
Nada obstante o momento ainda ser muito precoce para se supor eventual condenação ou absolvição, uma dúvida que pode surgir é sobre a possibilidade da candidatura e disputa eleitoral do pré-candidato para cargo municipal diante da nova situação processual.
Conforme as Leis Eleitorais e os entendimentos jurisprudenciais mais recentes, não vejo nada que impeça pré-candidato em questão de se candidatar, não sendo nem o caso de se tornar candidato sub judice, pelo menos não neste momento. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ao interpretar a Lei da Inelegibilidade, entende que o réu se torna inelegível a partir da condenação por órgão judicial competente em decisão transitada em julgado ou condenação proferida por órgão colegiado, ou seja, proferida em votação por mais de um Magistrado; neste último caso, mesmo que ainda caiba recurso. Até que uma dessas situações ocorra, o indivíduo seguirá elegível.
Até o momento em que escrevo esta matéria, não há nada além da denúncia do PGR contra pré-candidato, o que marca o início da ação penal. Logo, ainda não existe uma decisão colegiada contra ele atribuindo-lhe condenação. Contudo, isso não significa que este não sofreria as consequências da Lei da Ficha Limpa se eventualmente viesse a ser condenado por decisão colegiada transitada em julgado. Obviamente, neste incerto caso, se eleito, poderia ter seu mandato cassado.
Por fim, é importante salientar que, conforme o artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Sendo assim, por ora, tudo é especulação, sendo o futuro incerto e desconhecido.