Vitória Mendes
Com a colaboração de Milton Cardoso
Recentemente o revolucionário cartunista paulistano, de 65 anos, Angeli anunciou sua aposentadoria precoce após ser diagnosticado com afasia progressiva, doença neurodegenerativa que afeta a comunicação. Em março desse ano, esse mesmo distúrbio também encerrou a carreira do ator Bruce Willis (“O Sexto Sentido”) que anunciou sua aposentadoria.
O médico neurologista Raphael Palomo Barreira, especialista em Doenças Cerebrovasculares e membro titular da Academia Brasileira de Neurologia, explica que importante deixar claro para que a palavra “afasia” refere-se a um sinal neurológico, entendido como uma disfunção de uma área específica do cérebro responsável pela linguagem. Sendo assim, está presente em diversas doenças neurológicas de forma secundária, como no Acidente Vascular Cerebral (AVC), doença de alta incidência e principal causa de incapacidade no Brasil.
Já a Afasia Progressiva Primária (APP), o especialista explica que é uma variante clínica decorrente de um espectro de doenças por si só, chamada Demência Frontotemporal. “A própria APP tem algumas subvariantes com sintomas específicos, mas de forma geral, apresenta-se com a Afasia, dificuldade com a linguagem, nesta doença sendo principal sintoma, de forma insidiosa e progressiva. Pode alterar a fala, a verbalização, formação de frases, até a escrita, leitura e a comunicação como a compreensão da informação recebida, causando consequentemente limitações nas atividades de vida diária”.
De acordo com o médico, ainda não existe tratamento medicamentoso específico disponível, mas cabe ao médico a decisão de iniciar medicamentos na tentativa de minimizar possíveis transtornos secundários aos sintomas da doença, são exemplos a ansiedade e sintomas depressivos. “O tratamento não farmacológico visando a reabilitação fonoaudiológica dos pacientes deve ser estimulada, na tentativa de minimizar o impacto que o distúrbio de linguagem pode causar na vida do paciente, estimulando partes da linguagem não afetadas”.
De forma geral a doença acomete pessoas entre a quinta e a nona década de vida. Com maior incidência de início na sexta década. A evolução das duas variantes principais de APP se dá em 10 anos na média. Em um primeiro momento (fase inicial), somente sintomas leves da linguagem podem ser percebidos, com o avanço a disfunção se torna mais proeminente prejudicando as atividades diárias do indivíduo. Posteriormente sintomas comportamentais e declínio cognitivo modificando a memória podem existir.
O médico deixou ainda dois recadoso: “por favor não achem que tudo é afasia (risos). Esquecer de algumas palavras em uma frase ou do que iríamos falar é algo comum e não configura uma doença. E Na dúvida, o médico deve sempre ser consultado”.
Conheça a trajetória de Angeli – Arnaldo Angeli Filho nasceu em 1956 no bairro da Casa Verde, (São Paulo). Autodidata desenvolveu seu talento inspirando-se nos trabalhos de Millôr Fernandes, Jaguar, Ziraldo e Robert Crumb, papa dos quadrinhos underground.
Publicou seus primeiros trabalhos na revista “Senhor”. Em 1975 foi premiado no 2º Salão de Humor de Piracicaba e dois anos antes, começou a colaborar para a “Folha de São Paulo”, onde permanece até hoje (segundo o jornal, os trabalhos já finalizados do artista serão publicados até 2023).
Inquieto, em 1982, diversificou seu trabalho artístico e criou personagens que se tornaram ícones do quadrinho brasileiro como o punk Bob Cuspe, os hippies Wood e Stock e a liberal Rê Bordosa.
Em outubro de 1985 lança “Chiclete com Banana”, publicada pela Circo Editorial, revista referência do underground, que trouxe novas perspectivas ao universo de quadrinhos no Brasil. Surgiram outros personagens marcantes como Meiaoito e Nanico e os irreverentes Skrotinhos. “Los Três Amigos” parceria com os amigos Laerte e Glauco também é publicada na revista.
Ainda na década de 1980 ilustra o livro “República Vou Ver! ”, de Lilia Schwarcz. Em 1995, publica “FHC: Biografia Não Autorizada”, coletânea de charges produzidas durante o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Na TV, participa na produção de roteiros dos programas “TV Colosso” e “Sai de Baixo” (Rede Globo). Em breve, em comemoração aos 50 anos de carreira, será publicado pela Cia das Letras um livro em dois volumes com mais de mil imagens, material organizado por André Conti e Carolina Guaycuru, mulher de Angeli.
Angeli já participou de mostras de quadrinhos em vários países como França e Itália e, em diversas cidades brasileiras. Segundo o site Itaú Cultural, o trabalho do cartunista está incluído na Enciclopédia del Humor Latino Americano, da Colômbia, na Antologia de Humor Brasileiro e no Museu do Cartum e Caricatura de Basiléia (Suíça).