Esta história aconteceu quando se escrevia ficção sobre assuntos variados, na época em que Itapetininga ainda tinha engraxates e engraxaterias, garaparia em vários pontos da cidade. Casas de Sinuca (Romãozinho, Amador de Oliveira), bancas de jogo do bicho, garotos vendendo jornais em todas as ruas. Pode-se precisar o ano – década de 40 -, mas o que passou perdeu-se no tempo e hoje é diminuto o número de pessoas que vivenciaram esta quadra da existência.
Aliás, um período em que o Clube Venâncio Ayres (mais de 120 anos de vida) encontrava-se em pleno esplendor, admitindo sócios considerados da mais alta classe da sociedade e os aquinhoados da sorte. Enquanto outra entidade – comemorando agora seu centenário – o Clube Operário, abria suas portas para as classes mais populares, os trabalhadores de todas as categorias. Sua fundação (em 1916) deu-se em função e uma grande greve ocorrida no eixo Rio – São Paulo, por questões trabalhistas e salariais.
Itapetininga postava o invejável título de “Terra das Escolas”, em vista da existência da famosa Escola Normal “Peixoto Gomide”, hoje ultrapassando mais de uma década de seu centenário. Centenas de alunos, provenientes de diversas cidades do Brasil, aqui foram diplomados no magistério e jovens professores, então iniciaram a profissão em recônditos sertões e, mesmo em situações críticas, conseguiram levar o ensino e educação à centenas de comunidades.
Itapetininga conhecida e reconhecida como terra progressista em grande parte do território nacional, ostentava, com orgulho, ser o berço de grandes vultos brasileiros, como Júlio e Fernando Prestes, Ataliba Leonel, Venâncio Ayres, Pedro Dias Baptista, o escritor Batista Cepelos e outros de menos projeção no panorama nacional da época.
Contava com um forte comércio atacadista e varejista, além de grandes indústrias, como Matarazzo, Constantino Curi Tecidos, onde hoje é a garagem da prefeitura-, Godofredo Belfort, exportador e beneficiador de algodão, além de fábricas de cerveja e cigarros.
Era um dos principais pontos de comunicação com o sul do país, através da poderosa Estrada de Ferro Sorocabana, com grande quadro qualificado de funcionários, isto sem acrescentar as dezenas de entidades mantidas pelos governos federal e estadual.
Pois foi neste cenário de euforia, acrescido com o romântico e sempre lembrado Largo dos Amores, ao som da voz do cantor Orlando Silva, entoando a encantadora “Rosa” de Pixinguinha, transmitida pelo alto-falante instalado no alto do prédio Guidulhi.
Ela, com a idade de 25 anos, cabeleireira e ele com 29, militar servindo no 5º BC, nesta cidade, constituía um par invejável. Quando podiam, eram vistos dançando venturosamente nos clubes da cidade e infundiam ar de grande felicidade. Ela Maria e ele Ernesto, reuniam todos os requisitos para redundar num casamento repleto de venturas.
Após três anos de namoro estabilizado, ele foi transferido para outra cidade, cujo nome não foi revelado à Maria. Uma agonia apossou-se e deprimiu consideravelmente a moça enamorada.
Em determinada noite, quase sete anos depois da transferência, enquanto dormia, em sonho recebeu uma mensagem, avisando-a que fosse no dia seguinte na gare da então Sorocabana, à noite e aguardasse o trem vindo da capital paulista que seguiria para Porto Alegre, no Rio Grande do Sul.
Assustada, mas resoluta, foi à estação conforme a mensagem. Quando o trem chegou, foi informada que no último vagão da composição, encontrava-se um caixão funerário, com o corpo de seu namorado. Pálida e trêmula, não resistindo ao choque teve morte instantânea. Era uma Sexta-Feira da Paixão, naquele março de 1942.