Milton Cardoso
Especial para o Correio
A revista comemorativa “Edição Extra – 22 Anos da PRD-9” foi lançada em fevereiro de 1964, com tiragem impressa de mil exemplares, e idealizada por João Batista Siqueira, conhecido como Nete Júnior (1937-2014), que também assina a matéria. Nete foi sonoplasta, locutor e programador da emissora e fez um interessante retrato histórico de acontecimentos, programas e colaboradores da primeira estação de rádio itapetiningana, a lendária PRD-9. A publicação é uma raridade que registra parte da vida cultural da cidade aos diversos interessados em história das comunicações.
“Esta obra, simples, porém objetiva, é uma verdadeira relíquia futura que permitirá aos pósteros o conhecimento do que foi a ‘Tenda de Trabalho’, como costuma chamá-la o Sr. Alcides Rossi”, seu Diretor Proprietário”, escreveu, com exatidão, Pedro Franco no prefácio da revista.
No início do seu texto, Nete Júnior cita a primeira reunião para a instalação da rádio em Itapetininga, ocorrida em 14 de outubro de 1940 sob o comando de Bartolomeu Rossi. O texto, além de citar os envolvidos na aquisição do prefixo PRD-9 para Itapetininga, descreve as dificuldades iniciais para a concretização do grande sonho, entre elas, a instalação da torre.
A Rádio Difusora de Itapetininga PRD-9 foi ao ar no dia 12 de novembro de 1941, época que marcou o início de uma nova era para o rádio brasileiro e que posteriormente foi batizada de “A Era de Ouro”. Segundo a publicação, a inauguração teve “uma programação de abertura inesquecível para aqueles que tiveram a oportunidade de ver”.
Nos primeiros anos, os ouvintes da PRD-9 podiam acompanhar “Manhãs de Minha Terra”, “Na Ve¬lha Viana”, “Cine Rádio Sonoro”, “Programa Portenho”, “Programa Jornal Falado”, “Rit¬mos das Américas”, “Melodias em Desfile”, “Boletim Informativo sobre a Guerra”, “Desfile de Sambas”, “Cartaz de Hoje”, “Boa Noite Literário”, entre outros programas semanais.
Aos domingos, havia as concorridas apresentações no auditório da emissora na rua Quintino Bocaiuva, 720. Entre os vários artistas que participavam das atrações, estavam a dupla cômica “Nhô Bentico & Nhá Tuca”, os sertanejos “Oswaldinho e Rubião” e as orquestras “Venâncio Ayres” e a “Cruzeiro do Sul”.
“Dado o grande prestígio desses programas, a direção chegou ao ponto de organizar uma grade de associados, isso devido ao crescente número de expectadores em nossos estúdios, já que não se podia conter o número de pessoas que aqui compa¬reciam para prestigiar os grandes cartazes da¬queles tempos”, explicou Nete Júnior.
A revista de 36 páginas, amplamente ilustrada, demonstra um interessante trabalho de pesquisa de Nete Júnior, citando mais de cento e cinquenta profissionais (locutores, comenta¬rista, técnicos, artistas etc.) que foram essenciais no sucesso da rádio, como Antônio Arruda Mello, Seu “Mimi”, criador, na época, do programa de sucesso “Galeria dos Grandes Itapetininganos”.
Outro nome citado, hoje esquecido, é do cantor Pedro Batista, que perdeu “sua vida no mar, da mesma forma que Almir Ri¬beiro. (…) Deixou duas melodias gravadas em Long-play com o conjunto de Paschoal Melillo, ‘Silvia’ e ‘Amargor’, músicas que não tiveram ampla divulgação, mas foram muito conhecidas pelos Itapeti¬ninganos”.
A matéria teve o cuidado de citar profissionais que passaram pela emissora itapetiningana e brilharam em outras praças, como o músico Expedito de Carvalho, os locutores Arruda Neto, Carlos Henrique Mopir Valio e o redator Ibraim José.
A publicação abre espaço para dois nomes de destaque, o cantor Almir Ribeiro e o apresentador Nhô Bentico. Sobre Almir, escreveu: “Aqui na Rádio, também ele se destacou como locutor, técnico de som, programador e cantor. (…) O nosso saudoso Didi chamava-se primeiramente Augusto César, depois passou a se chamar Hélio Cesar. ‘Didi’ tinha mania de nomes, até que se tornou famoso com um só nome, Almir Ribeiro. Não esqueceremos esse rapaz”.
Sobre Nhô Bentico, destacou: “Outro que muitas glórias trouxe para a Difusora foi o fabuloso Abílio Victor, mais conhecido por Nhô Bentico. Esse homem elevou bem alto o nome desta emissora. Suas poesias são hoje letras e músicas, suas criações são co¬nhecidas pelo Brasil afora, foi ele, em síntese, um dos baluartes desta emissora. Muitos surgiram (…), mas ninguém até agora conseguiu superar em talento o Nhô Bentico. Ele foi o primeiro e será o único. Ninguém jamais ocupará o seu lugar”.
Para Nete Júnior, o sucesso sertanejo da rádio começou com Nhô Bentico e o programa “Manhãs de Minha Terra”. Ele foi o criador desse estilo dentro da emissora, abrindo novos programas de boa aceitação do público da região.
As duplas sertanejas tinham espaço garantido na programação da emissora, como “Rubião e Passarinho”, “Nhô Barbosa e Nhô Oliveira” e, no início da década de 1960, “Pedrico e Pedroca”, “Mariano e Marianinho”, “Zé Carpiano e Campeiro” e as “Irmãs Amadeu”, única dupla feminina sertaneja da emissora.
O Sucesso da Rádio – As famosas radionovelas produzidas pela PRD-9 também ganharam destaque. Implantadas na emissora em 1941 por Ayres de Souza, tornaram-se populares quando a direção artística ficou a cargo do casal Celso Antônio e Geralda Silva, criadores do inesquecível “Cortina de Veludo”. O primeiro programa foi ao ar em 1945, permanecendo até a década de 1960. Nete Júnior, que foi sonoplasta do programa, cita em torno de 60 nomes que participaram, de um modo geral, das audições teatrais da Rádio Difusora.
Obviamente, a publicação não se esquece de destacar a importância do futebol desde a instalação da programação da emissora, tendo como primeiro cro¬nista esportivo Cardoso Leite. Entre outros programas citados pela revista estão “Programa Infantil”, “Calouros” e o tradicional “Ave Maria”, inicialmente a cargo de Alves Lobo.
Com a autoridade de quem viu de perto as transformações por que passou a PRD-9, Nete Júnior elogia na publicação o esforço da diretoria na aquisição de novos aparelhos e de novos discos para o seu acervo, sempre atenta às preferências do público. Segundo a revista, em 1964, a discoteca da emissora itapetiningana possuía 12 mil discos em seu acervo.
“Edição Extra – 22 Anos da PRD-9” registrou em suas históricas páginas um glorioso momento da rádio em Itapetininga, quando as famílias se reuniam em frente ao aparelho para obter notícias, ouvir músicas e se emocionar com os dramas da “Cortina de Veludo”, época em que o rádio foi o principal veículo de comunicação de massa – estima-se que na década de 1950 mais de 70% da população brasileira tivesse um aparelho em sua residência.
A publicação reafirma a certeza de que a Rádio Difusora de Itapetininga PRD-9 foi construída por profissionais pioneiros e apaixonados que não mediram esforços para realizar um trabalho de qualidade para seus “milhares de ouvintes que diariamente sintonizam seus receptores para ouvir boas músicas e estar ao par dos acontecimentos desenro¬ados em nossa cidade”. Um legado perpétuo.