O carnaval dispensa interpretações filosóficas e conjecturas históricas.
Para os foliões, é um período de liberdade e irreverência, marcado pela informalidade dos festejos e pela expressão alegre e ritmada que contagia até habituais e notórios sisudos. Mendigos usam trajes de reis, milionários saem como mendigos, machões usam sutiãs e autoridades são ironizadas.
Sem um só golpe de Estado ou eleição, as autoridades são substituídas por um tal “Momo”, gordo risonho e descontraído. Em seu reinado, não há cordões de nomeados, discursos mentirosos e desvios de recursos. Não é raro receber as chaves das cidades, reconhecimento oficial de seu reinado.
Muitos foliões frequentam ruas, praias e avenidas, enquanto outros preferem os salões, onde maridos dormem e as esposas sassaricam. Diz a lenda que uma mulher, que brincou descalça, conseguiu manter intactos os dedos dos pés.
Samba, marchinhas, maracatu, frevo e outros ritmos embalam a animação, e os foliões que não sabem as letras viram compositores, não raro inventando versos impublicáveis. Blocos e Escolas de Samba conseguem o milagre que nosso sistema de ensino julga impossível, unindo participação, aprendizado e disciplina.
Fora da folia, multidões aproveitam os feriados para churracos, pescarias, esportes, ócio, consertos caseiros e retiros espirituais. Crianças jogam água e brincam, agradecendo a Momo pelo recesso escolar.
Policiais, bombeiros, socorristas, motoristas profissionais, funcionários de criatórios e lixeiros seguem trabalhando, permitindo a folia alheia. Políticos confabulam, aguardando a deposição de Momo.
A folia segue impune, deixando também um rastro histórico de vítimas, da violência de sempre, agravada pelo uso desmedido de álcool e drogas, nas estradas e esquinas espalhadas por todo o país. O ambiente descontraído propicia vulnerabilidades, e as estatísticas demonstram que novembro é pródigo em nascimentos.
Governos promovem farta distribuição de preservativos, para uns cautela, para outros incitação. Campanhas pela segurança do trânsito e direção responsável são encetadas, tentando o mal menor.
O carnaval é um evento milionário e cultural, gerador de empregos e consumos, atrativo turístico e terapia coletiva. Nosso ano produtivo, contudo, tem seu marco inicial na quarta-feira de cinzas, quando feições desestimuladas comparecem ao serviço, e a sisudez retoma sua frequência.
A folia não é obra divina ou demoníaca, eis que essencialmente humana, com seus encontros e desencontros, alegrias e tragédias. É uma pena que existam tantas vítimas desnecessárias e tantas famílias que terminam os festejos enlutadas.
Mais de 20 mil pessoas vivem na linha da pobreza
Em Itapetininga, 20.814 pessoas vivem na linha da pobreza, ou seja, aquelas cuja renda per capita mensal familiar não ultrapassa o valor de R$ 706, metade de um salário mínimo,...