O mês era outubro e o ano 1967 – soube da notícia um pouco antes de dormir. Senti a boca amarga, fiquei desnorteado e ainda assim no dia seguinte. Na época morava em São Paulo, lecionava em várias escolas e pela manhã, até chegar em uma delas, passando pelas bancas, os jornais não “falavam” em outra coisa! Em 1967, ainda não tinha acontecido, o Ato Institucional – 5 (que apareceria um ano depois) e a impressa nacional tinha ainda algumas liberdades apesar da ditadura civil-militar (de direita) reinante no Brasil. Nas manchetes, a fotografia de um homem extremamente magro, quase cadavérico, olhos abertos, olhando para o infinito. As rádios e televisões alardeavam a morte do “guerrilheiro” para algumas mídias e “terrorista” para outras. Na escola, uma professora, um tanto triste comenta para mim longe de outros colegas: – “Ele estava tão bem em Cuba, o que foi fazer na Bolívia? Louco! É o que dá para quem quer salvar o mundo. Louco!”.
Também pensei comigo: “O que ele tinha que fazer na Bolívia?” Por causa de suas atitudes um tanto estranhas questionando os camponeses bolivianos sobre suas extremas pobrezas e modo de vida deficitário que levavam. Foi denunciado por alguns deles (nunca ninguém tinha se interessado por eles camponeses, a não ser esse homem estranho!) ao exército boliviano. E a CIA norte-americana foi prontamente acionada. E a ordem foi: “Mate o homem!”. O “louco” era Ernesto “Che” Guevara, um médico argentino, um homem fisicamente bonito e cativante, que junto com Fidel Castro e seguidores, que, no final da década de 50 e início de 60, em Cuba, América Central, mostraram ao mundo um novo tipo de sociedade. Mas justa? Em educação e saúde parece que sim. Ernesto Guevara, o “Che”, queria passar esse novo modelo social para a América do Sul com países de classe sociais tão desiguais. Guevara, mais dias, menos dias, iria tornar-se uma lenda, um mito. E além de seus feitos aquela fotografia do seu rosto, tirada meio ao acaso por Korda, considerado um dos maiores fotógrafos do mundo, em sua época, colaborou bastante para isso.
“Che” Guevara foi um dos únicos personagens do século XX a chegar no século XXI, ainda com sua imagem estampada nas camisetas de milhões de jovens do mundo inteiro. E, no Brasil, em tempos de pandemia quando, alguns analistas políticos falam, de suas casas, muitos deles (mesmo os de direita), possuem em suas estantes a famosa fotografia do mito.